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Pergunta

“Qual é o seu grau de familiaridade com os conceitos da 4a. Revolução Industrial?”

A 4a. Revolução Industrial

E A 1a. Revolução Educacional?

Esta é a primeira pergunta de uma pesquisa on line lançada pelo Comitê de Estudos dos Impactos da 4a. Revolução Industrial no Mercado de Trabalho e na Sociedade, da Sucesu Minas – Sociedade dos Usuários de Tecnologia de Minas Gerais, que tenho a honra de coordenar. Mais da metade dos quase 1.000 respondentes, de todas as áreas profissionais, não tem a menor noção do que se trata. Surpreende e preocupa.

A 4a. Revolução Industrial, uma convergência de tecnologias físicas, digitais e biológicas, está mudando velozmente nossa maneira de viver e trabalhar. Onde estão os bancários, as cooperativas de táxi e algumas das redes de hotéis? Muitos foram substituídos por um mero aplicativo de celular. Robôs fazem cirurgias delicadas. Caminhões e carros autônomos já são realidade. Aplicações de realidade virtual e aumentada já substituem os corretores de imóveis. Sistemas de Inteligência Artificial, como o Watson, da IBM, já diagnosticam vários tipos de câncer com maior precisão do que especialistas humanos e fazem, em segundos, o trabalho que demandaria dezenas de advogados e milhares de horas. Impressoras 3D gigantes “imprimindo” casas, prédios, máquinas, pontes em questão de horas, dias ou um par de meses. Fintechs, Edtechs, Lawtechs, Healthtechs, Agrotechs… as startups de jovens visionários revolucionam o jeito de prestar serviços: tudo na palma da mão.

A ordem inexorável é: tudo o que puder ser digitalizado e automatizado será. Apertem os cintos: o mundo atual  é VICA – Volátil, Incerto, Complexo e Ambíguo (VUCA, em inglês).

E os impactos disto sobre o mercado de trabalho e a sociedade?  O Instituto McKinsey indica que, até 2030, 800 milhões de trabalhadores, no mundo, poderão perder seus empregos, a continuar em alta velocidade a automação. A boa notícia: também surgirão milhões de novos empregos, em áreas que já existem ou ainda não– Instrutor de Inteligência Artificial, Minerador de Dados, Agricultor Digital, Minerador Espacial, Designer Genético, Bioinformata, Especialista em Simplicidade, Engenheiro Hospitalar, Hacker Genético… Hmmm… será que estas posições serão ocupadas  por pessoas que nem estavam muito preparadas para a Revolução Industrial anterior – a Técnico-Científica?

O que o sistema educacional tem a ver com tudo isto? Tudo! A função do sistema educacional é fornecer à sociedade cidadãos qualificados, técnica e humanisticamente. Pessoas capazes de exercer um papel positivo, contribuir com seu trabalho e, através dele, sobreviver e melhorar continuamente sua vida, ao mesmo tempo em que contribui para a sobrevivência e melhoria contínua da sociedade. 

Se o sistema educacional deve servir igualmente ao indivíduo e à sociedade como um todo, é fundamental que leve em consideração e se adapte aos evolutivos contextos temporais e à mutação dos perfis e das demandas, em termos sociais, profissionais e tecnológicos. Estará isto acontecendo?

A educação já passou por três “revoluções”: a do 1 para 1 (um preceptor para cada aluno), a do 1 para poucos (educação para a elite) e a do 1 para muitos (universalização do ensino público). Mas o princípio foi sempre o mesmo: um que sabe transmite o que sabe para os que não sabem. Relação unidirecional, “bancária”, eficiente para um mundo previsível, anterior à explosão informacional. No mundo VICA, com os desafios novos que surgem a cada instante e onde a competição pelas vagas de trabalho será travada, cada vez mais, com robôs e sistemas de Inteligência Artificial, tal modelo não funciona mais. O professor não é mais o detentor do conhecimento. Prender os alunos em “grades” – curriculares e de horários – que não permitem uma abordagem holística e pragmática do conhecimento, voltada para a solução colaborativa de problemas reais, é condená-los a serem eternos “solucionadores de problemas já resolvidos”, inúteis na nova ordem. Perderão todas as fantásticas oportunidades trazidas pela 4a. Revolução Industrial e engrossarão as hordas de “walking deads” profissionais, a perambular sem perspectivas. 

Grandes nomes e grandes instituições, como o Fórum Econômico Mundial, vêm alertando para a importância de (re)qualificar  os profissionais atuais e futuros. A 4a. Revolução Industrial tem muito mais a ver com a questão social que com a tecnológica ou com os negócios. A velocidade exponencial com que se desenvolve não dará tempo para que as pessoas se adaptem ao novo perfil profissional exigido.

Diante de tamanha complexidade e dada a velocidade de mudança, a responsabilidade do sistema educacional é clara: não continuar a preparar seus alunos para um mundo inexistente. Desenvolver as chamadas “Competências para o Futuro”, um conjunto de competências TÉCNICAS (hard skills) e HUMANAS (soft skills – as únicas que garantirão aos homens um diferencial competitivo em relação às máquinas) é questão de sobrevivência. Máquinas são muito mais fortes e resistentes para realizar tarefas braçais e muito mais rápidas em enfrentar desafios intelectuais  crescentemente mais complexos, mas não são boas em empatia, liderança, comunicação eficaz, pensamento crítico, criatividade, senso de propósito…

É preciso reinventar, operacional e metodologicamente a escola, compreendendo-a como uma “função” e não mais um “endereço”, incorporando, por exemplo, a educação digital, o empreendedorismo, as metodologias ativas e a pedagogia de projetos e a “mentalidade startup”,  que colocam o aluno e a aprendizagem como protagonistas. Também alterar o papel do professor – de ministrador de aulas e “entregador de conteúdo” para gestor do ambiente  de aprendizagem, “curador de conteúdo”, facilitador, orientador…  Alunos têm acesso a todas as informações que quiserem e de que necessitarem, em seus smartphones, tablets e notebooks, mas,  deixados soltos, se perderão e se afogarão neste “oceano informacional”. Precisam, portanto, é de um guia, neste labirinto  do hipertexto, da hipermídia e das redes sociais.

É necessário, por fim, aproximar a escola da vida real, a academia das empresas, o estudante do novo mundo do trabalho  – não mais feito necessariamente de empregos, mas também de empreendimentos próprios, comprometidos com o bem estar da sociedade, como bem fazem as startups. 

“Falar é fácil”, dirão alguns. “O problema é o como.” Verdade. Mas, até pela experiência pessoal de ter liderado este processo de transformação em um conjunto de escolas, nos últimos anos, posso afirmar que há caminhos efetivos e prazerosos de injetar inovação na escola.  Alguns dos segredos:

  • conscientizar e capacitar os professores para a mudança, mas fazê-lo já usando as metodologias ativas, para que percebam sua eficácia para levá-los a aprender coisas como “Realidade Aumentada”, “Internet das Coisas”, “Inteligência Artificial”,  “Indústria 4.0”,  “Internet Quântica” , “Computação Cognitiva”, “Machine Learning”, “Cultura Maker” e tantas outras do “Mundo VICA” que permearão a vida e o trabalho de seus alunos; se aprendem bem assim, entenderão que seus alunos também são capazes de aprender ativamente;
  • pensar grande, mas começar pequeno: fazer um projeto piloto, com uma ou duas turmas, implementando algumas das possibilidades de inovação metodológica por vez – aula invertida, projetos, robótica, programação, atividades fora de sala e da escola, etc; semestre a semestre, ir ampliando o raio de ação.

Parafraseando o antigo provérbio: A escola morreu. Viva a Escola! Grandes empresas, como Google, Linkedin e IBM, já relativizam a importância do diploma universitário em seus processos seletivos. Cada vez mais, o que importa são as competências, as experiências de sucesso – e fracasso – que a pessoa teve e as nano-certificações que pode apresentar. Nada de cursos longos, engessados. “Long life learning” é o mote da vez – aprender sempre e aprender o que efetivamente vai adicionar valor. Para ser relevante neste novo mundo, a escola terá que se adaptar e não mais exigir que os alunos se conformem ao modelo pré-existente. 

Hora de deflagrar – de verdade – a 1a. Revolução Educacional (as anteriores foram apenas variações em torno do mesmo tema). A que libertará o potencial represado de estudantes e professores, sintonizará o sistema educacional com o novo mundo, os novos tempos e as novas demandas e afastará daqueles que nela confiam o fantasma do desemprego tecnológico. Uma revolução que nos permita formar seres humanos de primeira e não robôs de segunda, como disse alguém de que não me lembro o nome, recentemente. 

PS: Dois livros que recomendo, para quem desejar se aprofundar nesta temática: 

  1. Um mundo, uma escola – Salman Kahn (Fundador da Kahn Academy);
  2. A 4a. Revolução Industrial – Klaus Schwab (Presidente do Fórum Econômico Mundial).